Por Thiago Rocha
A agricultura brasileira enfrenta um paradoxo regulatório. Ao tentar reduzir as condutas lesivas ao meio ambiente normas infralegais acabam amplificando os desafios para o avanço na pauta de sustentabilidade. No cerne desta questão está o embargo, medida administrativa voltada a impedir a continuidade do dano ambiental, propiciar a regeneração do meio ambiente e dar viabilidade à recuperação da área degradada, conceito sedimentado pelo Código Florestal e pelo Decreto de Crimes Ambientais, o último assinado pelo presidente Lula em seu segundo mandato.
O diploma legal mencionado estabelece que o embargo deve se restringir aos locais onde efetivamente ocorreu a infração ambiental, não alcançando as demais atividades realizadas no imóvel. O objetivo do legislador ao fazer essa anotação foi de não criar obstáculos para a recuperação do ecossistema afetado. A preservação da capacidade econômica da propriedade rural é, por óbvio, medida imprescindível para a implementação de ações conservacionistas.
Conceitualmente, o embargo não guarda qualquer relação com a existência de culpa, isso porque se trata de uma responsabilidade objetiva, cujo propósito é a proteção ao meio ambiente. Apurada a ação ou omissão do proprietário ou posseiro, este poderá responder, de forma cumulativa, civil e criminalmente por seus atos.
É crucial, portanto, que o embargo não seja desvirtuado de sua essência, especialmente no que diz respeito a dar viabilidade à recuperação da área degradada. Excluir o empreendimento por completo do sistema financeiro significa fomentar o mercado de crédito não-regulado, notadamente mais oneroso, relegando a reparação do dano a segundo plano, uma vez que a própria sobrevivência da atividade produtiva estará em risco.
Inobstante ao arcabouço legal e às competências institucionais sobre matéria ambiental, a Resolução 5.081, de 2023, do Conselho Monetário Nacional, eliminou a concessão de crédito rural para empreendimentos localizados em imóvel que possua embargo ambiental vigente. Isso significa que, independentemente de culpa, dolo ou extensão do dano, toda a propriedade fica impedida de acessar recursos do crédito rural. Importante considerar que não estamos falando de uma determinação restrita a crédito com recursos oficiais, mas a toda e qualquer operação que venha a cumprir com as exigibilidades do Manual de Crédito Rural.
À primeira vista, e a quem está muito distante da realidade dos imóveis rurais, pode parecer uma medida adequada, todavia, a nova modalidade de restrição ambiental, o embargo financeiro, cria um obstáculo para o cumprimento da função social da terra. Este princípio, consagrado pela Constituição Federal de 1988, é refletido em critérios de produtividade e sustentabilidade, e tem padrões quantitativos estabelecidos pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).
Para se ter uma noção da complexidade, para ser considerada produtiva uma propriedade precisa, simultaneamente, atingir Grau de Utilização da Terra (GUT) superior a 80% e Grau de Eficiência da Exploração (GEE) superior a 100%, assegurar a conservação dos recursos naturais, além de atender a disposições legais trabalhistas.
A Resolução do Conselho Monetário cria uma dicotomia onde deveria haver confluência. Em um cenário de elevada competição mercadológica e de desafios climáticos crescentes, a imposição de entraves adicionais desloca o foco da eficiência e sustentabilidade da produção para a mera sobrevivência financeira, limitando investimentos em tecnologias e práticas que poderiam elevar a sustentabilidade dos empreendimentos rurais.
Portanto, torna-se inescusável a adequação da Resolução CMN n° 5.081/2023 para que o embargo seja aplicado exclusivamente à área onde ocorreu o dano ambiental. O Sistema Financeiro Nacional pode dar sua valiosa contribuição, canalisando esforços para apoiar a implementação dos instrumentos legalmente constituídos, como é o caso do Programa de Regularização Ambiental (PRA).