O Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR) visa incentivar a adoção dessa ferramenta de gestão de risco por agricultores. A presente pesquisa analisou a relação entre risco climático (especialmente hídrico), quebras de safra e apólices do seguro rural. Os resultados mostram que o PSR não está sendo utilizado por produtores sob maiores riscos (com mais quebras de safra e maior variação de produtividade), o que pode ser explicado pela carência de uma estrutura de concessão em regiões muito sujeitas a secas e outras intempéries climáticas.
A atividade agropecuária está sujeita às intempéries climáticas, o que aumenta a insegurança para as operações produtivas e financeiras que sustentam o processo produtivo. No Brasil, em que uma parte significativa da produção ocorre em territórios com clima semiárido, como o Cerrado, as mudanças nos regimes pluviométricos e nas demais condições climáticas podem impactar de forma direta o protagonismo internacional do agronegócio brasileiro alcançado ao longo das últimas décadas.
O seguro rural busca minimizar essas incertezas, reduzindo os riscos para agricultores e agentes financeiros envolvidos no custeio das atividades agropecuárias. Na ausência do seguro, o elevado risco leva agentes financeiros a deixarem de oferecer crédito ou demandarem garantias difíceis de serem cumpridas por agricultores, especialmente os médios e os pequenos.
DISTRIBUIÇÃO DO PSR
O PSR foi uma política criada pelo governo federal, em 2003, com o objetivo de impulsionar a difusão do seguro rural no Brasil, ainda muito aquém de outras nações com elevada produção agrícola, como os Estados Unidos.
A modalidade mais recorrente no Brasil, no âmbito do PSR, é a contratação de produtividade prevista. Nessa modalidade, estima-se a produtividade de uma lavoura e se contrata o seguro de uma parte ou toda a área plantada. Caso a produtividade não alcance a produtividade contratada, a seguradora cobre o valor até o contratado. Apesar de a operação ser realizada via seguradora privada, o PSR arca com uma parte do pagamento do prêmio, ou seja, divide com o produtor o custo de contratação do seguro para ser economicamente viável a contratação.
Os recursos do PSR estão geograficamente concentrados no Paraná, no Rio Grande do Sul, em São Paulo, em Santa Catarina e em Minas Gerais, estados com mais disponibilidade de informações atuariais e de zoneamento.
Os recursos do PSR são definidos anualmente no âmbito do Plano Safra. Contudo, o orçamento do PSR tem, ao longo dos anos, variações bruscas, que minam a confiança nele. Além disso, os recursos vêm se mostrando insuficientes para atender a ampla gama de produtores que compõem a agricultura brasileira. A distribuição dos recursos está geograficamente concentrada e fortemente correlacionada com a disponibilidade de informações atuariais e de zoneamento para a análise. Por exemplo, no período de 2006 a 2021, os estados do Paraná (38,2%), do Rio Grande do Sul (21,2%), de São Paulo (13,6%), de Santa Catarina (7,5%) e de Minas Gerais (5,7%) concentraram 86,1% da quantidade de apólices contratadas.
Quando se considera quais eventos climáticos são os mais frequentes no pagamento de indenizações dentro do PSR, verifica-se que a questão hídrica tem um grande protagonismo, sendo que mais de 65% dos sinistros estavam relacionados a secas entre 2006 e 2021.
As culturas com a maior quantidade de apólices de seguro no período foram: soja, (44,60% do total – 587.450 apólices); milho 2ª safra (12,42%); uva (9,10%); trigo (8,44%); milho 1ª safra (5,89%); arroz (3,72%); cana-de-açúcar (2,68%); café (2,57%); maçã (2,17%); e tomate (1,46%). Outras culturas representam 6,94%.
RISCO HÍDRICO, PRODUTIVIDADE E SEGURO RURAL
Em 2019, a Agência Nacional de Águas (ANA) divulgou o Plano Nacional de Segurança Hídrica (PNSH), em que apresenta o Índice de Segurança Hídrica (ISH) para 5.099 municípios brasileiros, que foram classificados em cinco categorias de risco hídrico, associadas a fatores humanos, econômicos e ecossistêmicos e à sua resiliência. Esse estudo revelou que a atividade com maior demanda de água no Brasil é a irrigação agropecuária (49,8%), ante 24,0% usados para abastecimento urbano.
A partir desses dados, foi possível analisar a relação entre o risco hídrico e as mudanças na produção agrícola. Para isso, foram selecionadas sete culturas de grande relevância na produção nacional, já considerando sua representatividade nas apólices do PSR, a fim de verificar quebras de safra e variações na produtividade. Essas informações revelam que as regiões com maior risco hídrico tendem a apresentar mais quebras de safra e maiores variações na produtividade.
Ao relacionar o risco hídrico e as quebras de safra com a concessão de apólices de seguro rural subsidiadas dentro do PSR, não se observa uma maior concessão de apólices de seguro nas regiões que apresentam maior risco hídrico e mais quebras de safra. Desta forma, o PSR não está conseguindo reverter essa “distorção” alocando a maior parte dos seus recursos em regiões com baixo risco ao produtor. Um exemplo seriam regiões produtoras de feijão no Nordeste, que, apesar de estarem em regiões com elevado risco hídrico, contam com baixa cobertura no PSR.
A efetividade dessa política depende do seu direcionamento aos setores da agricultura que vêm enfrentando maiores riscos climáticos. Apesar da necessidade de o seguro estar diretamente relacionado ao risco de ocorrerem eventos adversos, a concessão do seguro depende de uma estrutura institucional que envolve seguradoras, bancos, cooperativas e outras organizações que viabilizem a implementação do seguro. Um esforço adicional para direcionar os recursos de seguro no PSR poderia buscar mudar a atual distribuição da cobertura e, assim, levar o seguro a agricultores sob maior risco.
“…regiões produtoras de feijão no Nordeste, que, apesar de estarem em regiões com elevado risco hídrico, contam com baixa cobertura no PSR.”
Para um maior detalhamento metodológico, ver artigo “Segurança hídrica, produtividade agrícola e Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR): evidências para os municípios brasileiros”.
Autores:
BRUNO BENZAQUEN PEROSA – Professor e pesquisador do Instituto de Economia e Relações Internacionais da Universidade Federal de Uberlândia (IERI/UFU) – brperosa@ufu.br
WELBER TOMÁS DE OLIVEIRA – Economista e pesquisador do Centro de Estudos, Pesquisas e Projetos Econômico-sociais (CEPES/IERI/UFU) – welber@ufu.br
CARLOS CÉSAR SANTEJO SAIANI – Professor e pesquisador do IERI/UFU – ssaiani@ufu.br
Fonte: Revista AgroAnalysis – FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS | VOL. 43 | Nº 07 | JULHO 2023